Geometria do Acaso, por Leonardo Valente

 

Obra tão sensível e bela que agora ganha o mundo

Foto por Dobromir Hristov em Pexels.com

Como são belos o acaso planejado da arte e a sensibilidade do poeta em converter as subjetividades tão fluidas da vida em textos-objetos capazes de ocuparem lugares no espaço. Poucas expressões são dignas desses feitos tão sofisticados como a poesia, e em “Geometria do Acaso”, Luciano Lanzillotti transubstancia aparentes paradoxos em sentidos poético, estético e político, e com eles desenha formas e preenche lacunas em nossos vazios e nos vazios do mundo.

Um livro organizado pelo acaso metodicamente delineado e calculado, capaz de gerar uma genuína e variada geometria de sentidos, de organizar e dar liga narrativa por meio de analogias e alegorias suas cento e vinte poesias.” No capítulo de abertura, Esfera, o desenho contínuo e cronologicamente difuso do tempo (mas, acredite, “a culpa não é do relógio, máquina indefesa”), das lembranças, dos territórios e dos sentimentos. O tempo-circunferência que torna turva a memória de coisas relevantes e coisas pequenas. Um capítulo de poesias sem quinas, de sentimentos sem retas.

Como poeta consciente de seu tempo, Lanzillotti não se esquiva da política nem das mazelas do mundo que o cerca e que nos sufoca. E o acaso planejado para o segundo capítulo, chamado Pirâmide, imediatamente remete às hierarquias e injustiças, ao desenho desigual dos privilégios, da visibilidade e do poder do topo pequeno e pontiagudo, e do peso que a base suporta sozinha. Um título que, por si, considero a primeira poesia desta parte, prelúdio de toda a beleza vindoura aliada a um conteúdo lúcido e de relevância.

Cubo e Prisma são os dois capítulos finais, com suas diferentes faces e vértices, onde cabem sentidos diversos e diversidades contemporâneas que não raro nos deixam atônitos. Neles, o espaço ganha diferentes dimensões, da distância imensa e crescente dos amigos que viram contatos, ao tempo-espaço encurtado das selfies postadas e dos egos amaciados. Cubo e Prisma são lados de uma escrita diversa, multifacetada e ao mesmo tempo perfeitamente integrada. Impossível, ainda, não relacionar a obra de Lanzillotti ao último livro de Álvaro Pacheco, “Geometria dos ventos”, e ao famoso poema de Raquel de Queiroz em sua homenagem. Deste último, um de seus versos pode se encaixar perfeitamente na tarefa de retratar esta obra tão sensível e bela que agora ganha o mundo: “Eis que temos aqui a Poesia, a grande Poesia”.

Leonardo Valente

Escritor




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